sábado, 25 de fevereiro de 2006

António Lobo Antunes - escritor desconhecido


Ontem estive a ler uma entrevista de um grande para-Nobel português: o médico/escritor António Lobo Antunes. Antes de mais, tenho de confessar que nunca li nada dele... Uma vez tentei ler umas páginas de um romance qualquer dele que uma amiga minha estava a ler, mas não consegui “encarrilar” com a maneira como Lobo Antunes escreve (embora José Saramago também tenha uma forma de escrita muito própria, assim que li "O Ensaio sobre a Cegueira" tornei-me num leitor saramaguiano... Fico preso da primeira à última página!).

Como ía a dizer... Nunca li nada de António Lobo Antunes. Ás vezes tento ler as crónicas que semanalmente publica na Visão, mas não... Deve ser um problema meu...

No entanto, as entrevistas que dá de vez em quando são um verdadeiro luxo. Absolutamente deliciosas. Quer seja na rádio, na televisão, ou como a desta semana na Visão. São conversas ao mesmo tempo leves e profundas. Cheias de serenidade. Por vezes azedas. Cheias de raiva. Descomprometidas. Desiludidas. Tristes. Nostálgicas. Até lunáticas. Narcisistas.

Por isso, não resisto a transcrever umas frases da entrevista à Visão desta semana:


- [as crónicas] “começaram por ser textos alimentares. Precisava de dinheiro e a editora não pagava e, portanto, pensava que tinha de fazer textos leves que divertissem os leitores dos suplementos dos jornais.”

- “O que eu tento fazer é pôr a vida toda em cada livro.”

- “Sim, tenho uma grande provisão desses blocos [folhas de prescrição médica do Hospital Miguel Bombarda]. Dão aí para uns 200 anos... Já contei esta história: comecei a escrever nesses blocos porque eram pequenos e, como os meus pais não queriam que eu escrevesse, escondia o bloco debaixo dos livros de História e Geografia.”

- “O que me preocupa são os autores que dizem que «puseram os portugueses a ler». Isso é mentira. Puseram, isso sim, os portugueses a lerem-nos a eles – e isso não é ler.”

- “Quando morre um pai, tem-se a sensação de que, na próxima vez que a morte aparecer à porta, seremos nós a abri-la.”

- “Só penso naquilo que sempre pensei – oxalá tenha tempo para escrever mais alguns livros. E este é um negócio que vou fazendo com a morte. Vou negociando livro a livro.”

- [sobre a morte física]”Mas vou sobretudo ter saudades da vida. Vai aborrecer-me não estar cá para ver. É terrivel a brevidade da vida, mas às vezes a vida também é comprida. Churchill dizia que os anos passam num instante, o que custava a passar eram os minutos, que são lentíssimos. Já reparou como, a partir dos 25 anos, tudo é mais rápido?”

- “Sinto-me arrependido de, muitas vezes, ter passado pelos doentes sem olhar para eles. (...) Mas há muito tempo que já não olho para um doente como médico. Acho mesmo que nunca olhei bem.”

Até gosto de alguns dos títulos que publicou: “Boa tarde às coisas aqui em baixo”, “Eu hei-de amar uma pedra”, “D’este viver aqui neste papel descripto” “Que farei quando tudo arde”, “Não entres tão depressa nessa noite”...

Por isso, se houver alguém que me ensine a ler António Lobo Antunes, agradeço.

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