segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Amar os livros

Excerto de um artigo de Maria José Nogueira Pinto no DN:

"A leitura é uma realidade imensa, viagem que, uma vez iniciada, não tem fim, uma amarra de que ninguém pensa sequer libertar-se, uma porta para todos os outros mundos, um modo expedito para todos os encontros, todas as conversas. Como escutar às portas sem ser promíscuo. Como espreitar as vidas alheias, sem ponta de "voyeurismo". Uma maneira de esquecer e de lembrar. De estar aqui e acolá. De ser isto e mais aquilo. E não tem fim esta possibilidade de mil vidas em uma, única forma recomendável de mentir. Não mentir propriamente, mas imaginar, o que é diferente e sem sombra de pecado. Nélida Piñon chamou à escrita "o arfar da língua", Veríssimo (Luís Fernando, filho de Erico) definiu-a desta forma admirável: "Sempre escrevemos para recordar a verdade. Quando inventamos, é para recordá-la mais exactamente." Pepetela confessou que escrevia para sonhar e fazer sonhar. Montesquieu afirmava que não existia desgosto que uma hora de leitura não dissipasse.
[...]
Para os mais novos, a questão é ainda mais premente. Filhos de uma cultura informativa e de imagem, com poucos hábitos de leitura, são os futuros homo videns. Correm o risco de ficar à margem da percepção de tudo aquilo que releva na própria essência da condição humana. Se pensarmos no conjunto de estímulos indispensáveis à formação de cada um enquanto pessoa, parte substancial vem, seguramente, da leitura, do poder de interpelação que as histórias, que apenas os livros podem narrar deste modo, têm na estimulação dos sentimentos e da compreensão de cada um. Num quadro de absoluta liberdade, esse exercício individual e silencioso é uma forte argamassa para uma interioridade coesa que abre os caminhos para crescer."

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