E eis que hoje Dias Loureiro renuncia ao cargo de conselheiro de Estado.
Não tinha outra saída, depois de ontem a eficaz comissão de inquérito ao caso BPN ter ouvido Oliveira e Costa, ex-administrador do banco, chamar-lhe mentiroso.
(Como há minutos dizia Helena Roseta na SIC Notícias, é notável a acção desta comissão no desvendar de factos que nem a própria justiça terá conseguido. Os deputados que compõem esta comissão estão de parabéns).
Não sei se Dias Loureiro tem culpas no cartório ou não. Facto é que as suas explicações nessa mesma comissão parlamentar tinha elementos dúbios e espaço em branco. (Que ontem Oliveira e Costa conseguiu lembrar...)
E só isso, juntamente com a onda que se levantou, deviam ter levado o conselheiro de Estado a colocar o lugar à disposição de Cavaco Silva. Sobretudo porque é um elemento designado directamente pelo Presidente da República.
A propósito deste caso, no Público de hoje, Rui Tavares escreve uma crónica curiosa.
Citando uma parte (texto não disponível online):
“Se não servir para mais nada, serve para isto: o caso BPN tem sido uma longa aula prática de Sociologia de Portugal (…).
O estado normal e justo das coisas é este: deve ser considerado “gente séria” quem se comporta de forma séria. Em Portugal, a desigualdade começa por aí: um pobre deve provar que é sério ainda antes de agir. Mas o outro lado da moeda é que existe uma casta onde nenhuma destas situações se verifica: é-se considerado “gente séria” e “gente respeitável” por inerência, ou seja, para além de qualquer comportamento que se tenha. É-se “gente séria”, pasme-se, sem ter de se ser sério.
O caso BPN veio pisar e repisar esta lição. Dias Loureiro disse que estava no BPN porque lhe parecia que era tudo “gente sérias; Vítor Constâncio disse que se considerava à partida que no BPN estava “gente respeitável”; António Marta disse que Dias Loureiro lhe disse que “não andasse tanto em cima do BPN” que era feito de “gente séria”. Dias Loureiro disse em tempos que Oliveira e Costa lhe pareceu “gente séria”; e em tempos certamente que Oliveira e Costa tinha Dias Loureiro na consideração de “gente sérias”.
Muito bem. As declarações de Oliveira e Costa, ontem ao Parlamento, serviram para confirmar mais uma vez que esta “gente séria” mentia e mente, não fazia actas de reuniões e se esquecia de negócios que tinha aberto logo depois de os ter fechado. Dias Loureiro já se tinha apercebido de tudo isto, mas não ligou muito: afinal era tudo “gente séria”. Oliveira e Costa parece ter-se lembrado de tudo isso ontem, valha a verdade, com uma profusão de pormenores e circunstâncias que envergonha a memória de Dias Loureiro. Mas continua a atribuir tudo à “problemática do ego” quando a questão é de “problemática da casta”: imã casta onde toda a gente se tratava por “gente séria” independentemente do que fizesse ou do quanto mentisse, e onde toda a gente se pagava principescamente apenas por fazer parta da casta.”
Já ontem, no I, Jaime Nogueira Pinto escrevia sobre a crise de uma forma genérica, e notava as diferenças entre a crise de 1929 e a actual:
“Uma amiga dizia-me, em Novembro passado, a respeito da comparação da crise de 2008 com a de 1929: "Mas não é a mesma coisa! Ainda ninguém, ninguém, se atirou da janela, como os falidos da Sexta-feira Negra em Wall Street!"
É verdade, mas a razão não é das melhores.
É que em 1929 essas pessoas sentiam-se responsáveis, culpadas, pelos danos causados. Tinham vergonha pelos amigos enganados, pela família arruinada, pelo seu bom nome e reputação na lama.
Tinham sido educados na moral conservadora, puritana, religiosa, do cumprimento da palavra, da sacralidade do compromisso, da responsabilidade pelo risco. Agora já não: os protagonistas, primeiro, esperam que a sociedade ou o Estado lhes aguentem as perdas.
E depois não se atiram da janela; descem do elevador e vão almoçar - e bem - com os amigos. Ou dão uma entrevista na TV.”
Não tinha outra saída, depois de ontem a eficaz comissão de inquérito ao caso BPN ter ouvido Oliveira e Costa, ex-administrador do banco, chamar-lhe mentiroso.
(Como há minutos dizia Helena Roseta na SIC Notícias, é notável a acção desta comissão no desvendar de factos que nem a própria justiça terá conseguido. Os deputados que compõem esta comissão estão de parabéns).
Não sei se Dias Loureiro tem culpas no cartório ou não. Facto é que as suas explicações nessa mesma comissão parlamentar tinha elementos dúbios e espaço em branco. (Que ontem Oliveira e Costa conseguiu lembrar...)
E só isso, juntamente com a onda que se levantou, deviam ter levado o conselheiro de Estado a colocar o lugar à disposição de Cavaco Silva. Sobretudo porque é um elemento designado directamente pelo Presidente da República.
A propósito deste caso, no Público de hoje, Rui Tavares escreve uma crónica curiosa.
Citando uma parte (texto não disponível online):
“Se não servir para mais nada, serve para isto: o caso BPN tem sido uma longa aula prática de Sociologia de Portugal (…).
O estado normal e justo das coisas é este: deve ser considerado “gente séria” quem se comporta de forma séria. Em Portugal, a desigualdade começa por aí: um pobre deve provar que é sério ainda antes de agir. Mas o outro lado da moeda é que existe uma casta onde nenhuma destas situações se verifica: é-se considerado “gente séria” e “gente respeitável” por inerência, ou seja, para além de qualquer comportamento que se tenha. É-se “gente séria”, pasme-se, sem ter de se ser sério.
O caso BPN veio pisar e repisar esta lição. Dias Loureiro disse que estava no BPN porque lhe parecia que era tudo “gente sérias; Vítor Constâncio disse que se considerava à partida que no BPN estava “gente respeitável”; António Marta disse que Dias Loureiro lhe disse que “não andasse tanto em cima do BPN” que era feito de “gente séria”. Dias Loureiro disse em tempos que Oliveira e Costa lhe pareceu “gente séria”; e em tempos certamente que Oliveira e Costa tinha Dias Loureiro na consideração de “gente sérias”.
Muito bem. As declarações de Oliveira e Costa, ontem ao Parlamento, serviram para confirmar mais uma vez que esta “gente séria” mentia e mente, não fazia actas de reuniões e se esquecia de negócios que tinha aberto logo depois de os ter fechado. Dias Loureiro já se tinha apercebido de tudo isto, mas não ligou muito: afinal era tudo “gente séria”. Oliveira e Costa parece ter-se lembrado de tudo isso ontem, valha a verdade, com uma profusão de pormenores e circunstâncias que envergonha a memória de Dias Loureiro. Mas continua a atribuir tudo à “problemática do ego” quando a questão é de “problemática da casta”: imã casta onde toda a gente se tratava por “gente séria” independentemente do que fizesse ou do quanto mentisse, e onde toda a gente se pagava principescamente apenas por fazer parta da casta.”
Já ontem, no I, Jaime Nogueira Pinto escrevia sobre a crise de uma forma genérica, e notava as diferenças entre a crise de 1929 e a actual:
“Uma amiga dizia-me, em Novembro passado, a respeito da comparação da crise de 2008 com a de 1929: "Mas não é a mesma coisa! Ainda ninguém, ninguém, se atirou da janela, como os falidos da Sexta-feira Negra em Wall Street!"
É verdade, mas a razão não é das melhores.
É que em 1929 essas pessoas sentiam-se responsáveis, culpadas, pelos danos causados. Tinham vergonha pelos amigos enganados, pela família arruinada, pelo seu bom nome e reputação na lama.
Tinham sido educados na moral conservadora, puritana, religiosa, do cumprimento da palavra, da sacralidade do compromisso, da responsabilidade pelo risco. Agora já não: os protagonistas, primeiro, esperam que a sociedade ou o Estado lhes aguentem as perdas.
E depois não se atiram da janela; descem do elevador e vão almoçar - e bem - com os amigos. Ou dão uma entrevista na TV.”
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