Fernanda Câncio, no 5 Dias...
"Same old, same oldas mesmas, mesmíssimas palavras, a mesma, mesmíssima promessa, a mesma, mesmíssima ficção. tudo o mesmo, e no entanto nada. amo-te, só penso em ti, só te quero a ti. passas a vida a querer ouvir isto — tu e toda a gente. não inventas nada. só um rosto e uma voz para a cena, porém. um rosto e uma voz que não encontraste ainda ou que já conheces. só aquele. nenhum outro para o papel, nenhum outro para o fulgor. assim meses, anos, até que um dia muda, e tu não sabes porquê, não percebes, talvez nem queiras, talvez resistas, mas um dia já não queres ouvir nem dizer. perguntar-te-ão mil, milhões de vezes o que tu te perguntas — por que desapareceu, que era que desapareceu, onde está. não sabes dizer, não tens resposta, escutas o teu coração, tentas ouvi-lo como quem tenta ouvir deus, pedes um sinal, uma palavra, qualquer coisa. não virá daí luz, nenhuma luz. aprende comigo: nunca saberás porquê. nunca terás respostas e muito menos ‘a resposta’. é assim porque é assim, é assim como tudo é porque é. podes depois fazer contas e atribuir culpas e méritos, fazer colunas, longas colunas de deve e haver. mas não chegarás a nada, nenhuma iluminação. podes até dizer: se deixou de ser nunca foi. porque qualquer coisa assim tão intensa que se esvai sem aviso, sem notificação, não pode ter sido. inventaste tudo. enganaste-te. foi mentira. foi, foi mentira. não, nunca houve. não, nunca foi, nunca foste, nunca foram. inventa outra vez, inventa razões, motivos, enganos, traições. talvez nem tenhas de os inventar, talvez tenha havido isso tudo. e a outra coisa. sei isto, aprende comigo: nunca te habituas ao fim dessa coisa que nem sabes bem o que é. nunca te conformas nem resignas, mas vives com isso. vive com isso."